#6 Solidão

Gustavo Tanaka
3 min readNov 8, 2023

O ano era 2005. Eu cursava um semestra da faculdade de administração na Universidade Nova de Lisboa.

Em uma das conversas com um amigo português, falávamos sobre aspectos culturais e desafios de Brasil e Portugal. Então ele disse uma frase que até hoje ecoa dentro de mim:

"Cá em Portugal temos um problema social muito grave. Este problema se chama solidão."

Aquela foi uma virada de chave para mim. Eu nunca havia pensado na solidão como um problema social. No meu entendimento, problemas sociais eram aqueles que eram de responsabilidade do governo, como desemprego, segurança, moradia…

Mas naquele momento compreendi que tudo que envolve seres humanos de forma coletiva pode ser considerado um problema social.

Avançamos no tempo e estamos em 2023. Dezoito anos se passaram, e essa frase ainda ecoa aqui. E agora com mais clareza de quão grave é este problema. Cada vez mais vejo as pessoas sofrendo de solidão. Eu mesmo me sinto assim de tempos em tempos. A mesma internet que nos aproximou, nos distanciou.

Eu tenho percebido o quanto minhas relações estão frágeis. Ver o que um amigo fez no final de semana, ou acompanhar os registros da sua última viagem me faz sentir próximo. Mas a verdade é que tenho conversado pouco e me aprofundado menos nas relações. No passado, eu marcaria de encontrar este amigo para escutar histórias sobre a viagem, ver as fotos e passarmos tempo juntos. Hoje, eu vejo alguns stories ou alguma postagem desta experiência e acredito já saber como foi.

Outro dia prestei atenção a um mecanismo que estava acontecendo dentro de mim. Fui convidar alguns amigos para o lançamento do meu novo livro. Conforme buscava mentalmente para quem iria mandar esta mensagem, tive dificuldade. Pensei que seria mais fácil fazer um post ou jogar no grupo do whatsapp. Mas são estes artifícios que facilitam que também distanciam. É ilusão achar que porque postei meus amigos vão ver. É falta de envolvimento não entrar em contato pessoal e jogar tudo no comunicado coletivo.

Este foi um dos elementos que me incomodou profundamente nos últimos dias. Percebi que preciso melhorar. Já era algo que eu sentia, mas desta vez ficou mais evidente. Às vezes precisamos que uma coisa se torne mais cristalina e precisamos sentir mais profundamente para nos darmos conta do que é óbvio.

Ao invés de reclamar da rede social que entrega menos, estou decidindo dedicar menos tempo a ela para poder ter mais espaço para conversas individuais.

Percebi que tenho centenas de relações, mas que estão em sua grande maioria superficiais.

Meu compromisso é mudar isto.

Em 2005 quando meu amigo português me disse essa frase sobre solidão, achava que aquilo não se aplicava ao Brasil. Que aqui as pessoas são mais calorosas e gostam de estar juntas. Pelo menos essa era a minha realidade na época. O tempo passou e hoje eu sinto esse problema social na minha vida.

Para isso, sinto que é importante abrir espaço, consumir menos conteúdo e praticar estar mais em presença offline.

Escrever aqui é uma forma que encontrei de seguir compartilhando conteúdo e reflexões, sem me perder tanto na outra rede.

Gustavo Tanaka

Livro novo: "Não deixe pra depois"

Email de contato: contato@gustavotanaka.com

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